Alexandre Campanha - Lampião e São Pedro no Céu

Home

Lampião e São Pedro no Céu

Uma história com humor e irreverência. Depois de contar vantagem na terra, Lampião tem um diálogo incomum com São Pedro no Céu.
Autores: Alexandre Campanha e Francisco Diniz


Preste atenção, caro(a) amigo(a), Na história que relato, Pois o gato vira cão E o cachorro vira gato, Ao mando de Lampião, Boiada corre pro mato. Eu sou Lampião, guerreiro, Nascido em denso Nordeste, Dou tiro o dia inteiro, Meu sangue é cabra da peste Poucas batalhas perdi, A coragem me reveste. E eu marcho sobre o Xique-xique esverdeado, A estrela de Salomão No chapéu tá desenhado, Com meu punhal furo bucho, Não temo cabra safado. Eu caminho no agreste, Lá na várzea nordestina, Na caatinga e em toda Esta terra de menina Bonita e que tanto amo, É assim a minha sina. 1 Sempre forte eu adentro Veredas do meu Sertão, Sou parceiro, mas, porém, É certeiro meu facão Quando eu for desrespeitado, É assim meu coração. Minh'alma tem o mesmo cheiro Do cheiro da caatinga, Eu beijo Maria Bonita, Eu me deito na restinga, Eu sou barro do Nordeste, Sou orvalho que respinga. Sou Virgulino Ferreira Da Silva, o cangaceiro, Eu risco faca no chão, Meu sorriso é faceiro, Mas atendo por coragem, Dizem que sou desordeiro. Eu não temo um soldado Zé Baiano ou Graúna Nem mesmo um coroné, Dono de muita fortuna, Enfrento um cabra qualquer Se acaso me importuna... 2 Não importa se é tinhoso, Se age com rapidez, Eu saco da minha arma E faço dele freguês, Transformo ele em medroso, Em o vencido da vez. Eu não sei se o inferno É o meu destino certo, Baguncei feito o diabo, Minha vida é livro aberto, Se eu tiver conta a pagar Agora mesmo eu acerto. Andando com os bandoleiros, Fui chamado Lampião Preparo o parabellum, Tenho o punhal sempre à mão, Costuro minhas próprias roupas, Não tenho medo da ação. No meu cangaço eu tinha O Corisco e a Dadá, Esta, uma mulher de fibra, Disposta a enfrentar Qualquer batalha sem medo E também havia lá... 3 O brabo Pilão Deitado, Jararaca, que adianto, Dizem que se arrependeu Antes de morrer, portanto, Tem gente que acredita Que ele agora virou santo. Juriti, Caixa de Fósforo, Moeda e Quinta-Feira, Marreca, Alecrim, Colchete, E entram nessa fileira Enedina, Luiz Pedro, E segue a bandoleira: Elétrico e Cajarana, Macela e Mergulhão, Além de Maria Bonita, A mulher de Lampião, E um monte de cangaceiros Que não vou citar aqui não! Muitas batalhas travei Com suor e sem cansaço, Fiz coroné debandar, Venci prefeito no braço, Mas, porém em Mossoró Eu quase que me desgraço. 4 Virgulino no comando Dispõe de tiro certeiro, O meu facão no ar vibra, Na mão deste cangaceiro Se o "macaco" aparecer Atinjo o cabra primeiro. Eu sou o herói do Sertão Você pode comprovar, E cada um do meu bando Comigo estava a cantar E também a dançar xaxado Antes da luta enfrentar Ou depois pra celebrar Uma luta Severina Quando embrenhados na mata Ou no clarão da campina, E toda nossa batalha Era marcada em surdina. Lampião dança o xaxado, Inda canta uma canção Para Maria Bonita, Que fisgou seu coração, Ele luta e tem coragem Igual vaqueiro em gibão. 5 No dia em que fui vencido Lá na Grota de Angico, No Estado de Sergipe, Aqui eu não modifico, Cortaram minha cabeça E isso não é fuxico. Aí, quando eu despertei, Tava na porta do céu, Eu gritei por Padim Ciço - Vou ficar aqui ao léu? Eu exijo uma audiência Pra continuar o cordel. São Pedro se irritou Como um trovão dobrado: - Tu vais vaguear na Terra, Pois é grande o teu pecado E dessa mansão santíssima O teu nome tá riscado. Eu não sairei daqui, São Pedro tenha cuidado Senão dou-lhe uma peixeirada Se eu não for escutado, Chame logo Padim Ciço Cê tá mouco ou lesado? 6 Valha-me Deus Glorioso, Nossa senhora da Penha, Virgulino não me escuta, Vem botar fogo na lenha, Excomungo o desordeiro, Se o cabra de mim desdenha. Lampião né bobo, não, Depressa, pôs-se a rezar, E gritou por São Romão, A resposta veio já, Como um milagre, desceu, Um balão pra lhe levar. Levando as mãos pro ar, Gritou: São Judas Tadeu! Santa Bárbara, zangada, Do outro lado respondeu - Virgulino não se cria, E Tadeu lhe respondeu, Mas antes agradeceu À Bárbara, sua amiga, E disse: - Nesta mansão Não entra gente inimiga, Aqui a santaria é Corajosa e boa de briga. 7 São Pedro pegou a chave, Sisudo largou o café, Quem será esse intruso Metido a homem de fé? Entrando na mansão santa, Valentão, arreda o pé! São Pedro apelou pro sino E mandou Jorge chamar São Gonçalo, Santo Ivo, Mandou Santo Antônio parar De celebrar casamentos Pra também se achegar. São Miguel, São Gabriel Venham logo ajudar Pelejar neste cordel E chamem pra comandar A Santa Rita, de fibra, Pra Lampião enxotar. Depois de tanta conversa, São Pedro, tal realeza, Levantou e foi gritando, Mostrando sua brabeza, Me expulsou de lá com o cetro, Pra mim foi uma surpresa. 8

       

Rodapé - Alexandre Campanha - TDAH e Autismo em Cordel