Estrelas da Tarde



    Pág. 18 - ESTRELAS DA TARDE
      Alexandre Campanha e Roberto Prado

assistente que abriria quase no mesmo momento de minha formatura, numa clara confluência cósmica. Eu havia nascido para ensinar, e toda minha vida havia me fornecido os elementos indispensáveis a qualquer professor.

Então não a desmenti, ao contrário, sorri com nítida satisfação.

— É sempre um prazer ouvir um iniciante executar com tamanha graça a obra de Bach — disse, enquanto a ajudava a levantar o cello e fechara a capa. Ela sorriu, com visível satisfação.

— Eu gosto muito de Bach. Acho a música dele uma das coisas mais lindas da natureza — ela tinha um jeito meio tímido de falar, como se as palavras lhe saíssem pela boca com certa dificuldade e não era raro que desviasse o olhar quando era encarada de forma direta.

— Acho que hoje aprendi a ver ainda mais beleza em Bach, ou em Cello de forma geral — eu disse, retirando do bolso a cartela de cigarros da marca Camel e ofereci um a ela, que rejeitou de forma quase espantada, mas notei que seu rosto havia corado.

A bem da verdade eu não fumava, bom, desde a adolescência sempre fumei um cigarro aqui e outro ali, mas mais para acompanhar meus amigos ou alguma menina de quem eu estivesse a fim. Mas, no conservatório, havia descoberto que quase todos os grandes musicistas e professores fumavam, então adquiri o hábito de andar sempre com uma cartela no bolso, mais para momentos em que eu precisasse do que por querer fumar. Era uma questão que gosto de definir como sendo um estado da arte. O cigarro completava um quadro, além é claro de, pela marca, me afastar dos trabalhadores vulgares, ajudando por fim na manutenção de um certo je ne sais quoi próprio dos artistas.

— Como se chama? — perguntei assim que ela recusou o cigarro e eu mesmo acendia o meu. Essa era uma velha tática que eu havia desenvolvido na minha segunda passagem pelo colégio, perguntar o nome enquanto se obriga, por qualquer motivo, a não olhar a mulher nos olhos, dando a intenção


       
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